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"Se alguém fez qualquer coisa que imagina que afeta os outros de alegria, será afetado de uma alegria acompanhada da idéia de si mesmo como causa, isto é, contemplar-se-á a si mesmo com alegria. Mas, se ele fez qualquer coisa que imagina que afeta os outros de tristeza, contemplar-se-á, ao contrário, com tristeza". Baruch Spinoza (1632-1677), filosofo.

"No interior das frases, ali mesmo onde a significação parece ter um apoio mudo em sílabas insignificantes, há sempre uma nomeação adormecida, uma forma que guarda fechado entre suas paredes sonoras o reflexo de uma representação invisível e todavia inapagável". Michel Foucault (1926-1984), filosofo.

Estar apaixonado sempre traz para a pessoa fenômenos cômicos em meio também aos trágicos; e ambos porque a pessoa apaixonada, possuída pelo espírito da espécie (instinto), passa a ser dominada por esse espírito e não pertence mais a si própria. Arthur Schopenhauer (1788-1860).

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sábado, 22 de agosto de 2009

Psicopatologia
Existe prazer em matar?
Ao se aplicar a teoria freudiana à criminalidade, há indicações de um conflito entre o superego, id e ego, que favorece o surgimento de um egoísmo ilimitado, um forte impulso destruidor

Por Cláudia Maria França Pádua

O ser humano é agressivo e a agressividade é a conduta essencial à sobrevivência: seja para caçar, disputar parceiros sexuais ou para sobrepujar outros na conquista de bens escassos. Além disso, no caso do ser humano, a agressividade está relacionada com as atividades de pensamento, imaginação e ação verba/não verbal.

Consequentemente, alguém "muito bonzinho" poderá ter fantasias destrutivas ou até mesmo sua agressividade poderá se manifestar pela sua ironia, tornando-se irreconhecível perante as pessoas com quem convive. A educação e o meio social buscam o controle dessa agressividade. Assim, desde criança o ser humano aprende a reprimi-la e a não expressá-la de modo descontrolado e descontínuo, ao mesmo tempo em que a cultura cria condições de levar esses mesmos impulsos para as artes, esportes etc.

Para a Psicanálise, a agressividade é constitutiva do ser humano, é a ruptura do pacto social na própria sociedade, é a perfeita anomia representada pelo sujeito. E esse rompimento social pode implicar do ponto de vista inconsciente, a ruptura com o pacto edípico, desencadeando comportamentos delinquentes. Esse esvaziamento do real valor simbólico da lei, introjetada por Freud, é o verdadeiro sentido psicanalítico desta ausência de regras. Freud, como psicanalista, construiu sua teoria permeando nas evidências da constituição do sujeito a implicação da relação com o outro.

Essa função controladora ocorre no processo de socialização, no qual se espera que, a partir de vínculos significativos que o indivíduo estabelece com os outros, ele passe a internalizar os controles. Aí deixa de ser necessário o controle externo, porque o controle interno já se encontra dentro do indivíduo. Em todos os grupos sociais há mecanismos de controle e/ou punição dos comportamentos agressivos que não são valorizados pelo próprio grupo. E a sociedade também apresenta seus mecanismos, que se apresentam nas leis.

A estrutura social define o status e os papéis dos sujeitos e a estrutura cultural define as metas a serem alcançadas por parte dos membros da sociedade, assim como normas que devem seguir para que alcancem metas estabelecidas. A fragmentação do mundo social se revela quando somos incapazes de impedir que a violência se desencadeie como alternativa à solução de carências e conflitos, uma forma de reação pretextada pela luta pela sobrevivência, alimentando cada vez mais violência num processo social desenfreado e competitivo. As causas deste processo são multifatoriais e suas facetas são múltiplas.

A Psicologia Criminal, juntamente com a Psicanálise, verifica o estudo das relações entre o fenômeno exercido ou vivido do crime e a personalidade de seu autor e também da própria vítima, permitindo uma compreensão apurada dos acontecimentos da ação e do sofrimento alheio, associando a tudo isso um estado de "perturbação mental", alterando com desvios de comportamento quando o indivíduo alterna desempenhos na sua capacidade pensante.

Este transtorno está ligado a um estado de afetividade que se manifesta em violência, com requintes de crueldade e motivação momentânea. Pela motivação para a prática do ato violento pode-se considerar a existência de basicamente dois tipos de homicidas: o homicida emocional age com violenta emoção, por perceber a ocorrência de provocação injusta (causando indignação) por parte da vítima, produzindo uma ira que conduz à prática do delito, sem intervalo entre a provocação e reação. Já o homicida passional possui a incerteza do enigma de ser ou não amado (impotência para o desejo do outro) e assim vive uma experiência de privação, cuja incerteza o leva à prática delituosa. O que ele deseja é apenas a morte, símbolo imaginário que se caracteriza com seus desejos íntimos, ritualizados por prazer sádico. Esse desejo se revela no ato de destruir o outro "ruim", cuja dor sofrida é vista pela ação agressiva como uma compensação ritualizada do prazer.

Visão Freudiana
Um dos princípios que rege o funcionamento mental é o prazer: a atividade psíquica no seu conjunto tem por objetivo evitar o desprazer e proporcionar o prazer.

Sigmund Freud considera o complexo da violência como algo decorrente de possuir o homem um instinto natural agressivo. Ao se aplicar a teoria freudiana à criminalidade, há indicações de um conflito entre o superego, id e ego, favorecendo o surgimento de um egoísmo ilimitado, um forte impulso destruidor, uma ausência total de amor e uma falta de avaliação emocional dos seres humanos vistos como objetos, com um sentimento de culpabilidade que se busca sufocar por vários tipos de racionalização.

Freud explorou o conceito de que existe um conflito dentro das pessoas. O conflito seria de um instinto animal, recusado pela sociedade, causando então uma resistência do sujeito ao instinto. O sujeito reprime o instinto para o inconsciente e procura substituí-lo por outros métodos de compensação. Em sua teoria, Freud identifica vários métodos de compensação.

A pulsão tem por objetivo a satisfação plena. Quando a pulsão surge, ela tende coercitivamente para a realização do objeto focado. Para Freud, a pulsão é a transformação operada no par de opostos: sadismo e masoquismo (GARCIA-ROZA, 1988, p.128).

O sadismo consiste no exercício da violência ou poder sobre outra pessoa como objeto. Esse objeto é substituído pelo próprio eu do indivíduo (mudança de objetivo: ativo para passivo, e de objeto: do outro eu para o próprio eu). No masoquismo, um outro sujeito é procurado como objeto para exercer o papel de agente da violência.
Segundo Freud, o amor não admite um, mas três opostos, que são:
Amar/Odiar.
Amar/Ser amado.
Amar/Odiar - Indiferença.

Essas três formas de oposição remetem a três fases de nossa vida mental:
Sujeito (ego) - Objeto (mundo externo).
Prazer - Desprazer.
Ativo - Passivo.

Essas três polaridades articulam-se entre si e são responsáveis pelas vicissitudes das pulsões.

A base explicativa para essas expressões de destrutividade que caracterizam a agressão e a violência do ser humano é a fusão pulsional que impera e ativa para atos homicidas; a pulsão de vida e a de morte. Um excesso de agressividade sexual transformará um amante num criminoso sexual, enquanto uma nítida diminuição no fator agressivo o tornará tímido ou até mesmo impotente. A desfusão jamais atinge o ponto extremo das duas pulsões funcionarem autonomamente. A ideia de uma autonomia completa das pulsões é uma ideia limite análoga a do funcionamento autônomo do princípio de prazer e da realidade.

"Após o crime, há uma sensação de alívio e prazer.
Prazer que assume diversas formas"

Os matadores têm consciência de que se trata de um delito, mas a busca do prazer os impulsiona cada vez mais para cometer atos homicidas. É o desejo de matar que impulsiona a ação e a realização do ato.

Após o crime, há uma sensação de alívio e prazer. Prazer que assume diversas formas: alívio de um estado tensional, no qual a tensão se estabelece pela incerteza quanto à concretização do ato, e que se exaure após a morte da vítima. Prazer de abater a caça, eventualmente associado ao da exibição posterior de algum troféu ou fetiche, representado por um pertence ou parte do corpo da vítima. Prazer derivado da sensação de poder por abater a caça ou o adversário, mostrando-se mais forte ou mais inteligente do que ele. Prazer de poder manipular livremente o corpo inerte da vítima, com domínio total. Prazer de alcançar o usufruto de tudo aquilo que pertencia à vítima, tomando assim o seu lugar, por direito de conquista. Prazer de posteriormente assistir à reconstituição do próprio crime, ou de assistir às notícias e comentários acerca do delito.

Prazer de verificar seu grau de astúcia pelo acompanhamento das investigações, procurando saber que elementos de prova foram recolhidos, e pode até retornar ao local do crime para se inteirar dos acontecimentos posteriores ligados ao mesmo.

Perfil do criminoso
O criminoso dificilmente é identificado de imediato. Seu comportamento e maneira de se expressar no cotidiano não causam estranhamento se comparados aos das outras pessoas. Entretanto, na construção e execução do crime, manifesta-se ausência de sentimentos de afeto e não seguimento de princípios éticos e morais.

Os criminosos homicidas são considerados inteligentes, porque programam com argúcia seus delitos e raramente deixam rastros. O criminoso rebusca suas ações, mascara e fantasia cada cena vivida e reconstrói uma imagem de legítima defesa, para afirmar sua virilidade ao derrotar um antagonista - constrói um cenário próprio no qual "justifica" sua ação com a ideia de que "se tivesse permitido ao outro reagir, ele poderia ter levado a melhor".

Há algo de misterioso, envolvente nesta busca: o criminoso estuda sua vítima, trilha caminhos em que a envolverá e projeta um discurso interessante que denota prazer nas atitudes, gestos e fala. E assim ele percorre o caminho, com ares de matador profissional.

O comportamento violento nunca poderá ser atribuído a uma única causa (tendência inata, patologia, ambiente desfavorável, experiências negativas). É preciso compreender que a combinação destes fatores é que engendram o comportamento violento.

A reflexão sobre a multiplicidade do prazer, gerando violência, permite identificar um extenso conjunto de observações, questões e emoções do ser humano que integram o complexo criminológico.

A trajetória e o percurso do criminoso, seu perfil, a descoberta de várias facetas que o levam a cometer o crime, e consequentemente ao prazer absoluto, revelando que o ato de matar consiste na repetição de movimentos e de uma busca multifacetária da libido.

A violência se traduz em arquétipos, personalidades, características, perfis e história, e se apresenta das mais variadas e facetadas formas, nas quais os arquétipos simbolizam as verdades de cada indivíduo, e repousa no inconsciente mais profundo do ser em que habita.


Origem do estudo
Psicologia Criminal é o estudo dos comportamentos, pensamentos, intenções e reações dos criminosos. Procura saber o que faz alguém cometer crimes e que mecanismos levam a isso, além de suas reações após o ato. Grande parte começou em 1940, quando os Estados Unidos criaram um Escritório de Serviços Estratégicos. Lá William L. Langer's, famoso psiquiatra, foi encarregado de elaborar um perfil de Adolf Hitler. Após a Segunda Guerra Mundial, o psicólogo britânico Lionel Haward, enquanto trabalhava para a Royal Air Force, elaborou uma lista de características que os criminosos nazi de guerra podiam exibir.

A violência é o uso desejado da agressividade, que pode ser:
Direto: há a intenção de agredir o ser percebido como fonte (causa) de insatisfação, ou o alvo selecionado.

Substitutivo: um ser que não aquele percebido como fonte da insatisfação serve como objeto substituto para aplicação da intenção violenta, mormente se dispõe de menos recursos para reagir - por exemplo: o sujeito tem ódio ao chefe, mas como não pode atingi-lo, bate no filho ou tiraniza os subordinados.

A violência se encontra enraizada no ser humano, como impulso atávico, ainda que a convivência social promova o repúdio ao seu emprego. Talvez a solução passe por uma transformação do indivíduo na sua forma de interação com a sociedade da qual ele é membro atuante.

O ser humano que se propõe a mudar se destitui do velho homem para dar lugar ao novo, a fim de reestruturar e renovar suas atitudes morais e sociais. Esse ser humano terá conseguido sublimar ou redirecionar sua pulsão destrutiva para algo socialmente valorizado.

O crime persiste na multiplicidade de fatores que o alimentam e no prazer sentido por aquele que o pratica, que o leva a constantemente buscar reconhecimento perante seu grupo social. O desafio que se apresenta ao limite humano é o de construir efetivas respostas para o infinito prazer de matar.

Finalizando, acredito que a violência possui uma multiplicidade do prazer que nos permitiu perceber a busca infindável da complexidade do ser humano, de quem cada ato assume múltiplas facetas nos fatos criminosos que se realizam como estímulos do prazer e o fazem acreditar em seu próprio poder.

Referências

PÁDUA, Cláudia M. F. O Criminoso e seu juízo...Existe prazer em matar? Belo Horizonte: Líder, 2008, 103p.
BARRETO, Djalma L. G.
Violência, arquétipo e lei. Petrópolis: Vozes, 1975, 140p.
FROMM, Erich.
Anatomia da destrutividade humana, 2.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1979, 656p.
GAIARSA, José Angelo.
Agressão, violência e crueldade. São Paulo: Editora Gente, 1993, 176p.
GARCIA-ROZA, Luiz Alfredo.
Freud e o inconsciente, 4.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1988, 238p.
GAUER, Gabriel J. Chittó; GAUER, Ruth M. Chittó.
A fenomenologia da violência. Curitiba: Juruá, 2000, 190p.
PEREIRA, Carlos Alberto Messeder et al (orgs.).
Linguagens da violência.
Rio de Janeiro: Rocco, 2000, 344p.
GROSSMAN, Dave.
On killing: the psychological cost of learning to kill in war and society. New York: Little, Brown and Company, 1996, 366 p.
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, 400p.
PÁDUA, Cláudia. Tese de monografia para pós-graduação latu sensu
Crime e violência: a multiplicidade do prazer(ACADEPOL/MG - Academia de Polícia Civil de MG em 2004 para o título de Especialista em Criminologia). Está disponível para consulta na Biblioteca Nacional registrada sob o no: 368.519 - livro: 682 - Folha: 179.

Fonte: Portal Ciência e Vida, da Revista Psique, Edição 56, Artigo 180116, em 22/08/2010, às 10:32.

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